domingo, 8 de agosto de 2010

Conferência Internacional sobre Desenho Universal - Carta do Rio / 2004

A CARTA DO RIO

Em dezembro de 2004, no Rio de Janeiro, foi realizada a "Conferência Internacional sobre Desenho Universal. No evento foi lançado o documento intitulado Carta do Rio - Desenho Universal para um desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, um dos mais modernos documentos sobre o desenho universal. Vamos à ele:

Reunidas e reunidos no Rio de Janeiro, Brasil, em 12 de dezembro de 2004, na Conferência Internacional sobre Desenho Universal “Desenhando para o Século XXI”, profissionais, representantes de ONG e de diversos setores da sociedade civil, de universidades, funcionários e funcionárias de instituições estatais, de organismos internacionais e multilaterais, provenientes de diversos países da América Latina, concordamos com a seguinte declaração:

1. O propósito do desenho universal é atender às necessidades e viabilizar a participação social e o acesso aos bens e serviços à maior gama possível de usuários, contribuindo para a inclusão das pessoas que estão impedidas de interagir na sociedade e contribuir para o seu desenvolvimento. Exemplos destes grupos excluídos são: as pessoas pobres, são as pessoas marginalizadas por sua condição cultural, racial, étnica, pessoas com diferentes tipos de deficiência, pessoas muito obesas, mulheres grávidas, meninos e meninas, pessoas muito altas ou muito baixas e outras, que por diferentes razões são também excluídas da participação social.

2. Concebemos o Desenho Universal como gerador de ambientes, serviços, programas e tecnologias acessíveis, utilizáveis equitativamente, de forma segura e autônoma por todas as pessoas – na maior extensão possível – sem que tenham que ser adaptados ou readaptados especificamente, em virtude dos sete princípios que o sustentam, a saber:

· Uso equiparável (para pessoas com diferentes capacidades);
· Uso flexível (com leque amplo de preferências e habilidades);
· Simples e intuitivo (fácil de entender);
· Informação perceptível (que diminui riscos ou ações involuntárias);
· Tolerante ao erro;
· Com pouca exigência de esforço físico e
· Tamanho e espaço para o acesso e o uso.

3. Reconhecemos o valor do conceito emergente de Desenvolvimento Inclusivo, que tenta expandir a visão de desenvolvimento, reconhece a diversidade como aspecto fundamental do processo de desenvolvimento sócio-econômico e humano, reivindica a contribuição de cada ser humano para o processo de desenvolvimento e, em vez de implantar políticas e ações isoladas, promove uma estratégia integrada em benefício das pessoas e da sociedade como um todo. O Desenvolvimento Inclusivo é uma ferramenta eficaz para a superação da exclusão social que prevalece no mundo e, conseqüentemente, para conseguir avançar na erradicação da pobreza.

4. Concebemos o desenvolvimento humano sustentável como uma forma produtiva de entender as políticas sociais, considerando os vínculos entre crescimento econômico, distribuição equitativa dos benefícios do crescimento e em convivência harmoniosa com o meio ambiente.

5. Consideramos que a situação de pobreza e exclusão social atinge milhões de pessoas no mundo todo, impede o desenvolvimento humano e uma existência digna e com qualidade – e que na América Latina e no Caribe esta situação atinge quase a metade da sua população. Estamos também convencidas e convencidos de que esta situação de exclusão e pobreza, bem como a desigualdade, as doenças, a insegurança, a contaminação e a degradação ambiental e o desenho inadequado são perigos públicos, que afetam muitas pessoas e ameaçam a todas.

6. Neste contexto de domínio do desenvolvimento pela exclusão, propomos os seguintes desafios:

· Como aplicar os princípios do Desenho Universal quando existem pessoas cuja principal preocupação não é o “amanhã”, mas a incerteza quanto à próxima refeição ... ou que não têm moradia e nem a assistência médica mais básica?
· Como tornar tais princípios consistentes com o fato de que para a maioria da população mundial o conceito de “porta” não existe? Assim como “padrões básicos”, “códigos de edificação”, “regulamentações”?
· Nesta situação, que sentido real têm serviços como “o banheiro”, “a cozinha”, “o vestíbulo”, “a rampa”, “a iluminação”, “a acústica”?
· E, principalmente, como acrescentar qualidade de vida aplicando o Desenho Universal?

7. Salientamos que a aplicação no presente de um desenho inadequado de programas, serviços e infraestrutura gera inacessibilidade e perpetua condições de exclusão para o futuro. Consideramos inaceitável que recursos públicos continuem sendo utilizados para a construção de qualquer tipo de barreira.

8. Concordamos que o Desenho Universal deve se transformar num componente imprescindível das políticas e ações que promovem o desenvolvimento, para que este atinja um caráter verdadeiramente inclusivo e contribua eficazmente para a redução da pobreza no mundo.

9. Concordamos também, que para avançar na direção de um Desenho Universal para um Desenvolvimento Inclusivo Sustentável, toda nova ação terá de:

· ser planificada, equilibrando aspectos legais, de direitos, econômicos, tecnológicos e culturais locais;
· atender necessidades autênticas da comunidade;
· contar com a participação dos interessados;
· incorporar os critérios do Desenho Universal, para evitar que os investimentos gerem custos de adaptações necessárias futuras;
· aplicar materiais e tecnologias disponíveis no local, ao mais baixo custo possivel;
· planejar a manutenção com os meios locais e
· proporcionar capacitação adequada para permitir a aplicação técnica cada vez mais extensa do desenho universal.

10. Estamos convencidas e convencidos de que para conseguir que o Desenho Universal se transforme num instrumento a serviço do Desenvolvimento Inclusivo, é necessário que todos os atores envolvidos nestes temas (Estados e governos, setor privado, sociedade civil, ONG, Universidades, profissionais e organismos internacionais e regionais) desempenhem ativamente seus papéis e consideramos que devem seguir as seguintes linhas de ação:

· Que os governos envidem esforços para conseguir instrumentos jurídicos que façam com que o Desenho Universal seja aplicado permanentemente e que este seja um componente transversal nos planos nacionais de desenvolvimento e nas políticas públicas.

· Que o setor privado seja atraído para a aplicação do Desenho Industrial no desenho de produtos e serviços, que este tema se transforme num assunto de interesse público.

· Que as Universidades promovam o Desenho Universal na formação das profissões relacionadas ou afins com este conceito e incentivem a pesquisa que permita a expansão, a aplicação e o desenvolvimento do Desenho Universal.

· Que os profissionais diretamente relacionados com o Desenho Universal forneçam orientação técnica para conseguir sua aplicação mais eficaz e eficiente, voltada para o desenvolvimento e a inclusão social.

· Que as organizações no momento mais conscientes da necessidade do Desenho Universal contribuam para disseminar o conceito em outros setores da sociedade civil e exerçam um papel ativo de vigilância social para que se avance permanentemente na acessibilidade e inclusão através de sua aplicação efetiva.

· Que os organismos internacionais e regionais avancem no instrumental jurídico e normas técnicas que promovam a aplicação permanente do Desenho Universal ao serviço do Desenvolvimento Inclusivo.

· Que os organismos multilaterais de crédito transformem o Desenho Universal num tema do desenvolvimento, promovam seu avanço, sua aplicação prática, pesquisa e difusão com recursos econômicos e o coloquem como uma salvaguarda para a elboração de projetos e requisito para a aprovação de empréstimos aos países.

11. Pensamos que todos os esforços e ações realizados neste sentido serão mais fortes e eficazes se avançarmos numa agenda comum sobre o Desenho Universal e o Desenvolvimento Inclusivo e construirmos alianças e parcerias entre os diferentes setores e atores envolvidos. Mas continua necessária a criação de redes promotoras destes temas, que contribuam para sua disseminação e debate construtivo, para potencializar os diferentes esforços.

12. Finalmente afirmamos que estamos profundamente convencidas e convencidos de que se trabalharmos na construção de um mundo guiado pelos princípios do Desenho Universal e do Desenvolvimento Inclusivo, este será um mundo melhor, mais pacífico, mais habitável, mais equitativo e, inexoravelmente, com melhor qualidade de vida.

Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 2004.

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